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No seio da Literatura Cearense, destacam-se nomes como José de Alencar (1829-1877), Adolfo Caminha (1867-1897), Patativa do Assaré(1909-2002), Rachel de Queiroz (1910-2003), Ana Miranda (1951),Socorro Acioli (1975-), Tércia Montenegro (1976-), entre outros. Segundo o professor e escritor Batista de Lima, Fortaleza possui setenta ruas com nomes de escritores cearenses. Isso mostra que pelas terras alencarinas há um manancial literário rico, com excelentes escritores e que muito ainda pode ser explorado.

Desse manancial, destacamos aqui o cearense Moreira Campos (1914 –1994), que chegou a ser integrante do grupo Clã, um dos mais longevos grupos literários brasileiros que surgiu na década de 1940 e instalou de forma sólida o Modernismo no Ceará. Moreira Campos deixou-nos um conjunto de contos magnífico. Entre 1949 e 1985, publicou as obras Vidas marginais, Portas fechadas, As vozes do morto, O puxador de terço, Os doze parafusos e A grande mosca no copo de leite.

É de nossa ciência que a escrita de Moreira Campos se caracteriza pela concisão da linguagem, especialmente em seus contos, e pelo ar sugestivo em suas narrativas com pinceladas do fantástico. A estruturação linguística da sua produção literária lida com temáticas que fazem do leitor um coautor; este, por sua vez, precisa imergir na tessitura textual do escritor cearense para enlaçar os fatos e interpretá-los num “processo constante de recriação da obra”. Em outras palavras, no desvelamento da linguagem e dos seus sentidos, o leitor de Moreira Campos é instigado a cooperar com o escritor ao lidar com um texto de estrutura aberta, que propicia diversas possibilidades interpretativas e no qual se deve desenvolver um sentido que se manifesta no decorrer do ato da leitura e com as pistas deixadas na escritura narrativa daquele autor.

Mas o que nos dizia o próprio escritor sobre sua produção contística? Leiamos:

“[…] nenhum conto meu surge da fantasia. Há sempre um ponto verdadeiro, real que eu procuro transformar num conto. Se procuro transformar num conto, já estou compromissado com a arte literária, porque não é só contar o fato simplório, simples: Fulano de tal chegou em casa, viu a mulher em adultério, puxou o revólver… isto não é arte, é registro policial. A arte tem outra dimensão, é recriação do real. Aí cabe ao autor ter a capacidade para dar beleza, chamamento, é a recriação do real.” (Campos, 1996, p. 89).

O escritor recria, assim, a linguagem e o real para alcançar certo nível de expressividade em seus contos que despertam a intuição do leitor. Sua escrita não se arrisca a jogar com o inverossímil e o fantasioso. Ela é cuidada, pensada, organizada num rigor formal e estilístico próprio.

O fio do enredo, por sua vez, se desenrola com alguns nós pelo comprimento, e esses nós podem ser desfeitos – ou, no mínimo, afrouxados – na multiplicidade de significações e nas sugestões que permeiam seus contos, como podemos ver no excerto abaixo retirado do conto A sepultura:

“Tudo se fazia cúmplice: o silêncio dos dois homens, o ajudante que continuava à vontade no assento, as mãos graúdas enroladas na barriga, em modorra. O que antes não tivera qualquer sentido para Durvalina, crescia agora de significação: as pás ou enxadas, ferros outros que fossem, que vinham na carroceria e se entrechocavam a cada solavanco. O gesto do motorista dando-lhe a sobra do saco de pipocas transmitia-lhe certa confiança. Tudo precário, solto, vago. Notou que estava muito agarrada à bolsa. Melhor seria despregar-se dela.” (Campos, 1978, p. 30).

Através de uma escritura sintética e incisiva, o escritor mede as palavras e lança mão das minúcias, deixando a cargo do leitor o preenchimento dos vazios deixados intencionalmente no texto e na construção da imagem/cena proposta.

Por fim, vale ressaltar que modo como procurou tratar do homem e dos questionamentos que o perseguem, da vida cotidiana e de sua reinvenção, por meio de uma linguagem carregada de símbolos e sugerências, colocam Moreira Campos num patamar de excelência literária que não se pode desconsiderar. Fica, então, mais uma dica de autor a ser lido.



Referências



AZEVEDO, Sânzio de. Moreira Campos e a arte do conto. Revista de Letras,
Fortaleza, v. 7, n. 1/2, p. 43-52, 1984.
CAMPOS, Moreira. Os doze parafusos. São Paulo: Cultrix, 1978.
CAMPOS, Moreira; BARROSO, Antônio Girão; MAIA, José Barros. Roteiro Sentimental de Fortaleza: depoimentos de história oral de Moreira Campos, Antônio Girão Barroso e José Barros Maia. Fortaleza: Ed. UFC – NUDOC/SECULT, p. 23-102, 1996.

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Juliane Elesbão
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